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domingo, 18 de março de 2012

A VERDADE NA POLÍTICA

UMA MULHER VEM DE NEW YORK PARA FILOSOFAR NA UFU
e este blog comenta uma boa conferência
para as alunas da Pedagogia
e demais leitores

Agnes Heller, filósofa atual
Dona Agnes Heller falou semana passada sobre “política y moral”. Aí alguém ouve a frase anterior e já associa o político à safadeza, ao imoral. Ligação imediata e perigosa, pois o profissional da política não é toda a política: o homem (geralmente velho, branco, rico) que representa seus eleitores como vereador, deputado, senador, também age moralmente quando consegue ser prudente, sensato, ousado, ambicioso, etc. Então, ao ler o título da conferência de Agnes Heller, não deveríamos reagir como telespectadores distanciados da política. Não: “verdade na política” é um bom título e não podemos ficar desconfiados, tipo “política só sabe mentir”.
Dona Agnes Heller veio de Nova York para nos falar na UFU, em evento de Filosofia e Direito. Não voou à toa e anunciou texto novo, escrito pra ser lido em Uberlândia. Beleza de etiqueta acadêmica. E ela disse muito mais que isso: o político (e o jornalista), além de mentirem, também erram, enganam e se enganam. Crianças crescidas que somos, devemos ver a diferença entre mentir de propósito e nos equivocarmos. Acontece também no campo da política. E foi bom ver Heller incluir a imprensa e o as igrejas no campo da ação política (e da mentira). E é claro que a política também persegue a verdade, ou seja, no particular, um político também diz a verdade e eventualmente acerta.

Heller pode falar de cadeira:
verdade e política tem tudo a ver
Dona Heller tem 83 anos e veio tão longe nos falar de tema tão importante. Sua frase final pode ser entendida por todos e poderia mesmo ser proferida por muitos: “Admitir a possibilidade de falhas é a maior virtude de um político e um das maiores virtudes dos cidadãos.” The End. Palmas.
A diferença é o percurso da conferência, que a torna uma peça da filosofia:
a)      Heller compara Cristo e Pilatos. A frase afirmativa “eu sou o caminho e a verdade” é uma revelação de uma religião, ao passo que a pergunta de Pilatos – “o que é a verdade?” – seria uma típica atitude filosófica;
b)      Heller diferencia história e política, pois aquela trata do passado e esta, do futuro;

c)       Heller analisou os opostos da verdade: mentira, erro, engano, equívoco, etc. – e com isso faz um mapa dos conceitos envolvidos para explicar que alguns políticos “não estão mentindo, mas estão errados”;
d)      Heller mostrou a função paralela da retórica nessa conversa sobre a verdade, etc.

Perfeito. A filósofa húngara radicada em NY mostrou bem como é estruturado o discurso filosófico. Eu não sabia quase nada sobre ela, além de sua ligação com seu professor marxista Lukács. Ela não falou dele; investiu mais em Max Weber e citou Kant. E prestigiou outra filósofa muito importante, Hannah Arendt, ao criticar o totalitarismo: não havia política naqueles regimes (sob o qual ambas sofreram  - “tempos sombrios”).
Eu costumo ir aos eventos da filosofia e depois comento com os alunos. Faço isso aqui, primeiro para as alunas da pedagogia, para que tenham mais um exemplo de “como é a filosofia”: viva, atual, provocante, empenhada e diferente de outras “ciências”.
Mas eu eu? Saí do auditório 3Q do mesmo tamanho? Não. Fiquei feliz por ouvir e ver Agnes Heller, que era só um nome. Não esperei o debate e nem a tietagem. Mas apresento aqui às alunas da pedagogia – e demais leitores – algumas interpretação divergentes:
a)      Pilatos quis agir como político prudente em favor de Jesus. A pergunta sobre a verdade não era filosófica e nem retórica; Pilatos poderia livrar Jesus da execução e por isso relativiza, tipo assim “se tudo é relativo, porque você vai morrer por causa dessa verdade? Deixa disso, rapaz...”
b)      A política deve cuidar do presente e não do futuro – essa visão, sim, é coisa da aluna de Lukács, o marxista revolucionário – que queria dirigir a história e a consciência para um certo rumo, etc.
c)       A manipulação da verdade pelos políticos e jornalistas aproveita-se não só da retórica, mas da omissão e de manobras sutis. Um certo canal de TV deixa de mostrar a manifestação em Brasília que vai contra seus interesses privatizantes, por exemplo – e isso não é exatamente “mentir”. Uma esperta manobra é a sinceridade a respeito de coisas menos importantes. Por exemplo, o novo Ministro da Pesca também confessa que não sabe pescar. Os dois anteriores não sabiam “botar isca no anzol”. Simpática essa declaração, sem dúvida. Todavia “ninguém fala a verdade” sobre o papel desse ministério, que deve ser secundário para os peixes, pois o que interessa mesmo é o jogo de poder e a dança das cadeiras, etc.
d)      O tom da frase final da conferência de Agnes Heller é moralmente correto e seria aplaudido pelo anti-marxista Karl Popper: humildade e falibilismo, pois todos podemos errar, falhar (mas ninguém deve mentir – é bom lembrar).


Nossa grande virtude é admitir nossas falhas.

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