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sexta-feira, 27 de abril de 2012

CENTÉSIMO POST


Este blog do Pipe Show, que já transmitiu dois campeonatos da disciplina PIPPE, não está caindo pelas tabelas. Doch, doch! Estamos bem no meio de um semestre no curso de Pedagogia. E o blog é o veículo de informação, inclusive para quem perder aula. E queremos ver todas as 36 alunas chegar às quartas de final! Sem disputa de pênalties, pois há lugar para todas. Todas podem ser aprovadas, desde que... o de sempre: presença e notas. Não inovamos tanto assim. Seguidores e seguidoras, tem mail no box do pippe.



Na aula de hoje, acertamos coisas de bastidores e não vamos cansar a beleza de quem não faz a disciplina. Só algum relato, tipo la lengua española. Nossas caras alunas precisam perder o medo de ler textos em español e english. Precisam começar e pronto. E não é por causa de nosso programa, não. Vai ser importante a vida toda, inclusive para uma paseo en Buenos Aires, por supuesto. Há palavras bonitas em espanhol, como "salga" e "valga", mas não é tão fácil sacar que ali estão os verbos sair e valer, flexionados nessa forma preciosa. Mas temos que encarar, com dicionário e insistência. Espanhol é a língua mais próxima de nosso português. E lembrem-se que entender um português falando é mais difícil que ler um texto de filosofia em espanhol. Concordam? Já tivemos prezidents d Prtugall com legendas, na TV do Brasil...


Improviso. Ora, eu não iria ajuntar meus papéis e voltar pra casa, só porque o grupo não se achava em condições de apresentar o texto em espanhol. De boa. Então, começamos a apresentar o outro, também em espanhol. Em vez de ouvirmos uma exposição sobre "Sócrates, la filosofía e su enseñanza", de Walter Omar Kohan, vimos as primeiras páginas de "Enseñanza filosófica: notas para la construción de un campo problemático", de Alejandro Cerletti. Coloquei no quadro umas idéias centrais e comentamos o tema e a abordagem, saindo também do assunto, como é de nosso feitio.

E por falar em feitio, contamos uma historinha rara, sobre uma aula bem bolada. Quem leciona há 30 ou 40 anos, sabe que não é todo dia que vem uma sacada, uma encenação memorável. Eu poderia me lembrar de uma meia dúzia de aulas que receberam um apelido, tipo a "aula do pé de manga", "a aula dos besouros", etc. Teremos tempo de contar outras histórias. A de hoje é esta, com cara de sugestão aos novatos:
Era um curso de estética para alunos e alunas de artes, música, filosofia e alguns curiosos. Levei para a sala quatro ou cinco paletós ou blazers de vários tamanhos e cores e os entreguei a alguns alunos e alunas. Não disse nada. Começaram a vestir cada um, abotoar, desabotoar e trocar as peças entre si. E comentavam se a roupa estava apertada ou frouxa, se era cafona, bonita, confortável, etc. Além dessa "performance", levamos café em garrafa para a sala de aula. Depois escrevemos no quadro frases como "a estética deveria cuidar também dos ternos, como quando se prova uma roupa no alfaiate e diz que caiu bem ou não caiu" - e também: "a estética deveria tratar também do gosto do café". Só depois, bem depois que comentamos o que parecia evidente ali e experimentado, foi que contei de quem eram tais frases. Mostrei o livro e depois falei o nome completo do "Luís": Ludwig Wittgenstein. 

De novo, a conversa sobre línguas estrangeiras. Se você começa a aula pelo nome do filósofo, pode espantar a freguesia. Se você joga alguns volumes impressos em cima da mesa, desanima a galera. Então, que tal começar pelas idéias, pelos problemas? Claro que nem sempre temos como fazer isso; nem tudo permite uma dramatização. E tem hora que nem mesmo um professor de cursinho consegue rebolar diante de um teorema... Mas em muitos casos, funciona essa seqüência. E estamos falando de alunos adolescentes e jovens. Em conferência para iniciados, cairia mal qualquer coisa além de ler o paper (ops! em inglês aqui, "pêiper", texto para apresentar em evento). 


Claro que um dia, no futuro, vou contar boas histórias dessa turma da pedagogia. Podem apostar, pois é assim que funciona. Ou já posso contar agora? Creio que sim. Então, senta que lá vem história! Eis que este professor estava a criticar a democrática instituição em que trabalha há quase 33 anos. Sucede que um professor aposentado da UFU não pode mais pegar livros emprestados na biblioteca da UFU... E decerto eu estava com cara de lamento e leve revolta, tipo "isso é um ab-surdo!" Aí um aluna dá um bom conselho: "Professor, pra quê biblioteca? Você vai se aposentar e viajar, pescar..." (Ela tem certa razão, mas devo acrescentar aqui que preciso terminar ler de o Ulysses do James Joyce. Na verdade, vou ter que voltar várias à biblioteca, já que não poderei levar pra casa. Que nem um cidadão comum, irei à biblioteca pública da UFU e... vou  retomar do início, pois já me esqueci do que se passou até o meio-dia do Bloomsday, naquele romance de 765 páginas...)


E também falamos sobre perguntas inteligentes de crianças e do cuidado que devemos ter para não criar escrúpulos na criança. Exemplo: evitemos falar de "pecado", pois há outras maneiras de ensinar que é bom fazer o bem. E não funciona dizer a um menino de cinco anos que ele é machista. De repente, ele gosta da idéia e começa a ser grosseiro. A mãe poderia corrigir, de boa, seu inteligente garoto, sem inibir sua capacidade de perguntar e inventar. Exemplo: "Querido, a mamãe às vezes sonha de noite, quando dorme. Mas de dia, acordada, ela pensa. E com o seu pai é assim também: ele também pensa e sonha. Homens e mulheres pensam e sonham..." (Agora, cá prá nós: a outra conversa do menino, de apagar o sol com um enorme balde d´água, é mesmo coisa de filósofo pré-socrático... Tinha que estar no volume de Kirk e Raven!)

Tem mais coisas sobre a aula, mas o tempo passa e agora, daqui em diante, eu só estou fazendo cera, pois quero inteirar 100 fotos de caixas postais alemãs aqui, para marcar a centésima postagem.


Além do que, enviei email para a lista da turma, acertando pontuação de tarefas e o programa de exposição das próximas aulas. Vamos expor os textos do dossiê sobre ensino de filosofia, que saíram no número 44 da revista Educação e Filosofia e podem ser lidos de graça no site www.seer.ufu.br

E vejam em breve aqui: 101 posts pra você ler antes de, pois vai que...


sexta-feira, 20 de abril de 2012

COMO É QUE SE ENSINA ISSO?



Aqui estamos contando o que vai rolando na disciplina Filosofia, oferecida ao curso de Pedagogia, na UFU. Imaginamos, com algum conhecimento de causa, que as alunas terão muitas aulas e leituras de f/e, ou seja, de Filosofia da Educação. No plural, pois há inúmeras filosofias da educação (e não precisamos inventar mais). Sendo assim – e parece-nos que assim é - , vamos dedicar algum esforço e tempo na outra área de confluência: e/f, ou seja, Ensino de Filosofia.
Eis aí uma situação real em que filósofos e educadores têm que se entender: a filosofia pode ser ensinada, ao contrário da insinuação contrária do camponês da anedota. E daí cabe perguntar: como é que se ensina isso?
Ora, não é necessário que aquele que ensina filosofia precise saber “o que é filosofia”, de maneira definitiva, completa, fechada. É possível que um cara que não sabe nadar possa ensinar outro a nadar, pois ele sabe como se nada. E poderíamos trazer outros exemplos desse naipe. Por seu lado, aquele que quer (ou deve) aprender mais sobre filosofia já sabe sempre algo sobre filosofia – e não vai nunca partir do zero. E nem nadar no seco.
Meu 0,1 (um valor positivo diferente de zero, mais que nada): a pergunta muito comum entre calouros da filosofia “viemos aqui para aprender a filosofar ou para aprender filosofia?” não chega a ser uma falsa questão, improcedente; faz sentido. Todavia, a pergunta mesma não é nem filosofia, nem filosofar; é meta-filosofia. E reconhecer isso é um grande avanço.

UM ESCÂNDALO, DOMESTICADO
No primeiro dia de aula, descobrimos que as 36 alunas desta turma não conheciam a revista Educação e Filosofia. Tínhamos que resolver logo essa carência, pois esse periódico acadêmico de alto nível, produzido na UFU, é nosso orgulho, resultado de quase 30 anos de muito trabalho. E mais ainda: uma prova viva de que a colaboração entre educação e filosofia é um mais que uma questão acadêmica; é um resultado do trabalho de profissionais dessas duas áreas.
Este professor fala com satisfação dessa revista, que ajudou a criar e a manter. Foi diretor dela, revisor, tradutor, membro do conselho. Foi e ainda é lá colaborador – com vários artigos e resenhas publicados – e parecerista. Agora, resolveu parcialmente a curiosidade das alunas, ao doar a elas 18 exemplares de números diversos, que tinha repetidos em seu acervo. As que ainda não ganharam um exemplar – além das demais colegas e de toda a humanidade letrada – poderão ler a revista online e de graça.
NA ILHA – Tivemos duas aulas na Vila Digital do bloco 3Q. Aí pudemos ensinar e aprender como acessar essa revista e outras tantas. Simples e de graça. Entre no site WWW.seer.ufu.br
e procure a revista Educação  e filosofia. Escolha o último número publicado ou entre em “anteriores” e localize por ano, volume e número. Depois, escolha pelo título um artigo e clique à direita em “PDF”. Pronto. Abrir e ler.
Assim, hoje, chegamos ao volume 22, número 44, de 2008. Esse número merece a capa dourada, de fato, pois é o sonho dos editores: um número temático, um dossiê sobre o ensino de filosofia.
Já sabíamos há 30 anos que só com a pesquisa poderia manter a revista. E agora vemos que o mundo da filosofia tornou-se mais e mais organizado e produtivo, com mais verbas e oportunidades, mais cursos de pós-graduação, sobretudo nas universidades públicas. Assim, esse dossiê foi possível depois do trabalho de um GT (ou dois?) ligados a nossa ANPOF (Associação Nacional de Pós-graduaçao em Filosofia), ou seja, o número 44 registra a discussão de um grupo orgânico, que tem uma discussão amadurecida.
Nas próximas duas ou três aulas, vamos apresentar e discutir os seis artigos do dossiê, cujos autores são: Odilio Alves Aguiar, Alejandro Cerletti, Sílvio Gallo, Desidério Murcho, Gonzalo A. Palacios  e Walter O. Kohan. Em breve, falaremos dos títulos e conteúdos.
Dois dos artigos estão em español... E queremos encorajar as alunas a ler e entender essa lengua hermana. Podem apelar para tradutores automáticos e dicionários online. E não será preciso traduzir todo o texto. Basta lê-lo todo e fazer um roteiro para o dia da apresentação. E é bom que as alunas queiram planejar para que até o final do curso possam ler também em inglês. Sim, caras alunas, treinar a competência em alto estilo.

SEGUIDORAS – Aproveitamos a visita ao laboratório de informática também para incentivar mais uma vez a visita a este blog. Motivação: cada aluna que se inscrever como seguidora do blog vai ganhar 15 pontos (em 100, do semestre). Boa idéia, não? Aos poucos, vamos aumentando o número de seguidores e visitantes. E esperamos manter o blog depois do fim deste semestre letivo, que já é o terceiro – antes, com o Pippe, e agora na Pedagogia. Novos seguidores são bem-vindos, também de fora da escola.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

MAS O QUE É FILOSOFIA MESMO?

Sejam bem-vind@s à filosofia! Talvez a uma das tantas filosofias. Pior: à minha visão (im)pessoal e transferível filosofia. E nem precisam limpar o pés.

No mês de março estivemos a distribuir amostras grátis: alunas, aqui está uma provinha da minha filosofia – o ensaio. Deu mais ou menos certo. Isso equivale a dizer: saiu, como sempre acontece, meio errado. Mas é bom que a insatisfação seja explicitada. Digam, se for o caso: ainda não entendi, ou entendi e não concordo, não gostei, etc. Pois ainda temos muitas aulas nestes próximos três meses. Depois, direi: fui.

Gostou? Então leia mais.


Sempre tem gente querendo saber: o que é filosofia mesmo? Diferente talvez das perguntas: ...mas o que é mesmo a filosofia? O que é de fato a filosofia? Tanto faz acrescentar essa ênfase ou não; eu não vou começar a resposta com um típico “Na verdade, a filosofia é...” Pois sempre estivemos na verdade. O café mesmo é diferente do café misturado, mas a filosofia pura não existe: a mente pura é a pura mentira!
Tudo bem, vocês se cansaram do ensaio e querem o show, com gravação de DVD e tudo. Vamos lá. Ainda no quadro negro, escrevemos “filosofia” e destacamos “filo+Sofia”. Sofia é sabedoria. Usamos palavras compostas, como filantropia, hidrófilo, cinéfilo, para sacar que filo é amor,  amizade. Daí que filosofia tenha sido entendida como “amor à sabedoria”. Não é a própria sabedoria? Não resolve muito, mas é um rótulo tão bom quanto geografia e geologia – que nunca dizem tudo, mas servem pra distinguir uma área da outra. Os funcionários do protocolo e da biblioteca sabem muito bem para onde encaminhar os envelopes e os livros: departamentos, estantes. Senão: de volta ao remetente.

Agora, para atender pedidos, eu trouxe para a sala de aula duas definições de filosofia. Uma complicadíssima (a)e outra legível (b).

(a)  Filosofia é ontologia fenomenológica universal, que parte da hermenêutica do estar-aí, a qual, como analítica da existência, amarrou o fim [a ponta] do fio condutor de todo questionamento filosófico, ali de onde se origina e para onde conduz.” (p. 57)

A frase é de Martin Heidegger, citada e comentada pelo caro mestre Ernildo Stein, em seu muito elogiado livro Seis estudos sobre Ser e Tempo. E “Ser e tempo” é o título mais conhecido de Heidegger, que morreu em 1976. Na sala de aula, desmontei um pouco essa bela definição complicada. Um repeteco da explicação não vai funcionar aqui. É claro que o livro de Stein comenta e situa essa frase. Por exemplo, ele destaca o caráter circular dessa definição, mas como muitas definições boas são as circulares, chega-se com isso a noção de “boa circularidade”, o oposto do “círculo vicioso”. E o bom círculo é o círculo hermenêutico. Compreendemos algo porque já estamos compreendidos em algo, há algo a ser compreendido, etc. Mas essa frase não foi trazida com a intenção de encerrar a conversa, tipo: vocês querem uma definição bonitinha? Então, tomem esta e mais esta! (Como se isso bastasse para voltarmos a meu plano inicial , com a exibição do ensaio, ao vivo.) P.S.: tomei a liberdade de sugerir “ponta” em vez de “fim” para o fio condutor, na frase acima, traduzida por Stein. Em alemão, Ende pode ser um e outro, mas... vamos evitar a ambigüidade  e facilitar um pouquinho as coisas para o leitor.


(b)  Quem quiser uma longa explicação do termo filosofia, com um pouco de história e palavrinhas escritas em grego, tipo filosofia... Brincadeira. Isso aí é wingdings e não é grego, mas estou com preguiça de inserir símbolos do alfa-beta. Por exemplo, o dicionário de filosofia do Ferrater Mora, muito bom, em 3 ou 5 volumes, conta que os termos “filosofar” e “filósofo”  surgiram antes do termo “filosofia”. Faz sentido. E era usado para distinguir isso daquilo que faziam os sofistas (mesma raiz “Sofia”, com outro uso).

Mas, já que as alunas costumam achar que filosofia é sempre coisa antiga e de velhinhos-baixinhos-carecas, aqui vem uma quentíssima e recente explicação do que seja a filosofia. E, de bônus, para facilitar a Xerox, uma anedota sobre a figura do filósofo. Pois como dizia mestre Th. Kuhn: cientista velho tem livros velhos, assim como predinho novo tem criança pequena. Ou seja, vi um aluno do mestrado com um livro novo, de um autor novo e pedi para tirar cópia. Para renovar meu estoque. O autor é francês, 62 anos (novo?), e deve estar vivo por aí: André Comte-Sponville (Dicionário filosófico, Martins Fontes, 2003)
O filósofo Comte-Sponville é tão francês quanto
o galã Jean-Paul Belmondô...

A definição começa bem: “Filosofia: uma prática teórica (mas não científica), que tem o todo por objeto, a razão por meio e a sabedoria por fim. Trata-se de pensar melhor, para viver melhor”, etc.


E agora, a anedota sobre o filósofo, que as alunas estão lendo para comentar:

_ O que o senhor faz? – indaga o camponês.
_Sou professor de filosofia.
_Isso é profissão?
_ Por que não? Acha estranho?
_ Um pouco!
_Por quê?
_ Um filósofo é uma pessoa que não liga pra nada... Não sabia que se aprendia isso na escola. (p.251)


No primeiro dia de aula, levei para a sala de aula o livro de entrevistas do jornal francês Le Monde, um bom painel do pensamento nos anos 80, com 20 nomes, quase todos franceses. Além dos desiludidos e malucos, eis um que tem um bom motivo para ser filósofo, o que nega a opinião errada do camponês:

Porque eu sou filósofo?
Por causa de Hiroshima
(Michel Serres)

Ele se pergunta e se responde. Ótimo. Não fiquem esperando um jornalista do Le Monde. E atenção, alunas e leitores que ainda não tem uma grande meta na vida! Vocês podem ir (ou vir) para a filosofia por causa de... Fukushima. E não temos muito tempo, antes de Angra 3, Pré-Sal, Belo Monte...


A rosa radioativa
Estúpida e inválida

(Vinicius e Ney)